COMBATENDO O FOGO
UMA HISTÓRIA DE: João Paulo Ritter
Daniela jogou o mapa de um dos bairros nobres da grande Porto Alegre sobre uma mesa enferrujada de metal, se encontrava no galpão com Miguel e Leandro, mais um plano para pegarem Combustor estava sendo traçado.
— Faltam mais dois médicos alvos do nosso cara, dos que trabalham no hospital em que sua esposa morreu, como Miguel explicou ser o seu motivo para essa vingança peculiar. — Disse Daniela fazendo um risco sobre o mapa com um canetão vermelho.
— O que está fazendo? — Perguntou Leandro confuso.
— Eu vi isso em alguma série aí e achei legal, mas enfim, esses dois últimos médicos vivem na mesma rua. Então, com certeza, dessa vez não haverá troca de lugares. — Olha para Miguel. — Toda a noite você vai ter que ficar patrulhando essa área, tudo bem?
— Sim, eu posso fazer isso. — Tentou sorrir.
— Ótimo. — Sorriu a jovem e logo levou sua atenção até o amigo que não tinha superpoderes. — E você, Leandro, espero que consiga gravar um vídeo tão ótimo que faça com que essa merda seja monetizada logo, entendeu?
— Isso leva tempo, mas eu entendi. — Leandro sorriu irônico.
Daniela sorriu, parecia muito animada com a situação. Se sentia uma administradora muito fodona, poderia conquistar o mundo com a energia que estava se tornando quase palpável.
— Acho que dessa vez vamos pegar o nosso vilão. — Disse a garota sorrindo de orelha a orelha.
Por volta da meia-noite Miguel já se encontrava no bairro onde aconteceria o último ataque de Combustor, já preparado com seu uniforme e pronto para, desta vez, acabar com os atos do vilão.
Daniela e Leandro estavam em seus respectivos quartos monitorando o amigo com a ajuda de um software que o jovem asiático havia comprado recentemente para essas ocasiões, os benefícios de se ter dinheiro a disposição.
— Vocês tem certeza desta vez, não é mesmo? — Perguntou Miguel flutuando de um lado para o outro sobre o teto de um antigo casarão da rua. — Não me mandaram para o local errado de novo?
Daniela bufou do outro lado.
— Tu ‘tá no bairro certo, Miguel, agora para de falar e fica de olha para quando o nosso vilão aparecer! — Disse a garota negra ficando sem paciência.
— Combustor. — Leandro sussurrou do outro lado.
Miguel sentiu a energia de Combustor se aproximando lentamente daquela quadra, ficou em silêncio rapidamente e levantou voo, procurando por seu alvo. Conseguiu ver a sua figura se espreitando pela rua iluminada, não tinha ninguém além dele naquele horário, mesmo assim Miguel não conseguia parar de se perguntar como em outras ocasiões não suspeitaram ao se depararem com uma cena daquelas.
— Vou para de falar agora, o show vai começar. — Sussurrou o super-herói para seus amigos.
Espreitava pelo céu de uma distância segura, pois não queria ser visto pelo seu alvo. Combustor caminhou até uma casa de dois andares no final da rua, suas mãos começaram a emitir as suas chamas, um ataque estava sendo elaborado.
O homem levantou seu punho direito, o abriu e então uma esfera de fogo surgiu em sua palma, sem faze nenhum tipo de som ele a jogou em direção a casa.
Rapidamente o Anjo Noturno surgiu em frente a vidraça que seria estilhaçada para o fogo entrar, criou uma barreira com sua energia, ao entrar em contato com esse escudo a esfera em chamas explodiu fazendo com que o nosso herói fosse jogado contra a residência.
— Você de novo. — Sussurrou o vilão. — Eu mandei não se meter em problemas de gente grande, seu moleque!
Com dificuldade Anjo Noturno se levantou e correu na direção de Combustor que também se aproximava, energizou sua mão com a sua energia roxa enquanto o outro fez o mesmo com suas chamas, seus punhos estavam próximos de acertarem seus objetivos.
Um horrível barulho estava vindo do lado de fora, parecia como uma briga, os sons estavam perto demais da casa. A pequena criança loira levantou da sua cama de princesa e correu para a janela do seu quarto. Seus olhos castanhos ficaram arregalados com o que ela viu. Um anjo lutava com um homem que jogava fogo pelas suas mãos.
Saiu gritando do seu quarto, correndo para o dos seus pais e dizia:
— Mãe, pai! Um anjo está lutando com o diabo lá fora!
Os três acabaram se encontrando no corredor, os pais pareciam a par da situação e assustados.
— Tem um anjo e um homem de fogo lá fora. — Disse a pequena mais uma vez.
— Eu sei filha, eu sei. — O pai disse. — A gente tem que sair daqui.
— É aquele homem horrível do noticiário, não é? — A mãe perguntou ao seu marido.
— Sim, ele atacou quase todos os médicos do hospital onde trabalho, deve ser um tipo de serial killer, não sei.
— Eu estou com medo. — A criança sussurrou após escutar o diálogo dos adultos. — Mas aquele anjo está aqui para nos salvar, não é?
Os dois mais velhos trocaram olhares, não tinham se certeza se a figura desconhecida estava ali para ajudar ou não era mais do que um cumplice do incendiário e começaram a brigar no meio do caminho.
Quando seus punhos fechados se tocaram, uma explosão de energia jogou herói e vilão para longe um do outro, Anjo Noturno acabou invadindo a casa quando seu corpo quebrou a parede. Combustor derrubou o muro da casa da frente com o impacto do seu corpo.
Com dificuldade, o super-herói levantou do chão, retirando o pó da sua roupa, viu que tinha alguns rasgos pelo tecido roxo. Pelo menos não rasgou naquele lugar, pensou enquanto levantava, percebeu que a família da casa o observava com medo.
— Tudo bem, eu não vou ferir vocês. Estou aqui para ajudar, precisam fugir antes que ele se aproxima demais. — Dizia o anjo enquanto levantava.
O homem pegou a criança no colo, olhou para a esposa e segurou sua mão com firmeza e em seguida saíram correndo para os fundos da casa, em direção a uma porta que deveria dar a salvação deles. Sem pensar duas vezes, Anjo Noturno se virou em direção a rua e com toda sua velocidade voou para o seu inimigo que também se aproximava, acertou um soco em seu rosto e em seguida mais dois. Sua raiva tomava conta dos seus golpes.
— Eu acho a sua visão de justiça bem distorcida, não sei no que vai ajudar você fazer tudo isso por vingança. — Disse o super-herói depois de interromper seus golpes.
— Você não entende porque é uma criança. — Combustor o encarava com raiva, seus olhos, literalmente, pegavam fogo.
— Para mim faz isso para se sentir melhor, um motivo totalmente egoísta.
— Cala a sua boca, seu merda! — O punho tomado por chamas azuis acertou com tudo o estomago do herói adolescente. Anjo Noturno caiu no chão de costas, alguns centímetros longe do seu oponente.
Com passos lentos Combustor se aproximou do corpo adolescente, pelo tecido do seu traje o levantou para cima, passando um pouco a altura da sua cabeça, com sua mão livre preparou outro soco tomado por chamas alaranjadas.
— Você me disse que faz isso por vingança, por causa da sua esposa… Ma-ma-mas ela gostaria de ver você destruído casas e colocando outras vidas em risco? — Disse o adolescente encarando seu oponente nos olhos, seu objetivo era usar a memória da falecida esposa para tentar fazer com que seus sentimentos se sobressaíssem sobre seu desejo de vingança.
Não é algo que Miguel estava muito orgulhoso de fazer no momento.
— Cala a boca!
Mais uma vez jogou Anjo Noturno para longe, caindo de barriga para baixo dentro da casa. Começou a se arrastar, se afastando enquanto Combustor se aproximava.
— Que merda de ideia se tornar super-herói, vai ser divertido Miguel, você estará ajudando a comunidade, enfrentando vilões que vão surgir graças a pedra roxa espacial que você pegou. — Sussurrava enquanto se arrastava.
— Você ainda é uma criança, não sabe o que eu sinto e como é perder alguém que você ama, nunca passou por isso. — O vilão dizia enquanto parava em frente ao jovem, o encarou com raiva no rosto. Quando percebeu que o adolescente também o lançava uma expressão igual, ficou confuso.
Miguel levantou com paciência do chão e rapidamente acertou um cruzado de esquerda e depois outro de direita em Combustor.
— Acho que ambos não sabemos nada sobre o outro para ficarmos soltando esses tipos de afirmações… Você disse que nunca perdi alguém importante para mim, mas não é verdade. Perdi meu pai, eu ainda era muito novo, mas sinto falta dele porque ele foi muito importante na minha criação… — Com seus punhos energizados começou a socar o vilão sem parar, peitoral e estomago, continuou até o derrubar no chão e depois acertar mais alguns chutes em sua barriga. — Ele me ensinou a gostar de coisas cientificas mesmo que eu não as entenda muito bem, me ensinou a olhar para o céu e admirar as estrelas e talvez… Se ele não tivesse feito essas coisas, hoje eu não seria quem sou.
Combustor tentou revidar com mais um soco, o escudo de energia protegeu nosso super-herói que em seguida tomou distância com suas asas e disparou uma grande rajada de energia em sua direção.
As lembranças do pai de Miguel foram se aglomerando em sua memória, saudades e raiva se misturaram dando a ele mais força que foi utilizada em seu ataque final, aumentou sua potência que se tornou o suficiente para vencer a batalha. Quando se aproximou de Combustor, ele se encontrava sem consciência no chão.
— Venceu? — A voz de Daniela surgiu no ouvido esquerdo de Miguel.
— Sim. — Suspirou. — Mas me sinto estranho, eu não concordo com o que ele fez, acho que essa vingança no final não resolveria nada, mas mesmo assim…
— Entende a sua motivação. — Sussurrou Daniela que também parecia compreender.
— Sim. Eu entendo. — Ficou alguns segundos em silêncio, olhando para o corpo adormecido. — Vou leva-lo para a delegacia mais próxima, vão saber para onde o levar.
Anjo Noturno pegou Combustor em seu colo, logo levantou voo e desapareceu no céu escuro da madrugada. No caminho pensou em como aquela família estaria, pensou também no sonho com seu pai e no final entendia a conversa que deveria ter com sua mãe. Aquela era a hora certa.